
Há tres meses atras eu era outra pessoa. Um pouco mais calmo do que o título do blog sugeria, mais de bem com a vida, ansioso com o lidar de um filho que chegava, mais tolerante. Feliz. Isso mudou ainda mais e assumiu proporções que só entendi de fato no domingo passado quando trocava o Gabriel após uma visita a avó. O sorriso já franco de gengiva sem dentes, o pouco cabelo fino e ralo, os olhos redondos e claros, a expressão de felicidade me fizeram desabar em prantos quando entendi o que estava ali na minha frente. Se há três meses ficava apaixonado com o fato daquela coisinha simplesmente existir, num crescendo espetacular toda aquela felicidade e boa ventura transformaram-se numa especie de epifania. Um laço de um Amor diverso de tudo que havia experiementado até então me fez perceber o quanto eu vou estar ligado a essa criatura para o resto da minha vida. O fato que ele vai crescer, perder roupas e dentes, ganhar quilos e centímetros, chorar, rir, amar, ralar os joelhos, fazer perguntas, fazer mais cocô, dar cambalhotas, ficar bravo, viver, tudo vira sublime, história da Vida, como um excelente episódio de Cosmos explicando o maravilhamento humano frente ao existir. O que mais soava na cabeça naquele minuto era: Eu quero viver até os 138 anos para ver você, Gabriel, um velhinho aos 100 anos de orelhas pequeninas e com o mesmo sorriso de gengivas. Vai ser engraçado, a gente pode revezar quem vai trocar as fraldas de quem. Não se esqueça que por força da idade, eu vou ter mais experiência.
Tudo muda quando se tem um filho, era a frase que eu mais ouvia. E durante um tempo entendi, talvez erroneamente, como se as pessoas dissessem para aproveitar a vida enquanto ainda tinha uma, o sono, o casal, a grana, por que depois acaba tudo. Você não tem mais vida e só vai viver em função da cria. Pois é verdade sim, vivemos em função do Gabriel, mas que vida fantasticamente boa de danar! E sobra sono, grana, casal… Esse se transforma. Se num momento da vida cheguei a conclusão de ter a Tania ao meu lado e que um teria que aguentar o outro até o fim da vida, hoje essa ligação tomou ainda outro tom. O melhor projeto que poderia elaborar a dois, com ela. Há muita gratidão envolvida aqui. Há o amor e o Amor transformado. E isso é algo que há pouco tempo atrás eu achava que nunca mais ia sentir na vida. Eu tinha uma idéia que talvez mudasse um pouco, mas não desse jeito.
E você começa a perceber a felicidade e o amor nos outros, e como isso também se transforma com a convivência. O amor dos avós com o Gabriel é algo lindo de se ver. E dos tios, amigos, até o estranho na rua que pergunta: mas tão durinho! só três meses? Que fofo! Parabéns! É coisa maravilhosa entender isso, que é novo para mim. Já tive, claro, minhas paixões adolescentes, os amores platônicos, os carnais, os “pra sempre”, amor em relação aos pais que pode parecer apenas memoria de infância, mas que hoje é muito presente e vivo, amor de irmã, amor de família e amigos. Mas amar a um filho é novo, e digo, gigantesco. A coisa fácil seria dizer que amo o Gabriel mais do que todo mundo que já amei ou amo, ainda que só um pouquinho para evitar ciumes, mas seria errado. É um Amor diferente, é como se eu não tivesse escolha. Domingo passado senti isso. Não tenho escolha a não ser amar. Mesmo que eu tivesse, seria muito fácil escolher.
E nem me importo se for só da minha parte. Difícil, mas vai que um dia ele diz: “Quem, esse cara? Já me quase me afogou umas duas vezes na banheira, e ainda fica pingando uns troços no meu nariz, segundo ele, para “eu respirar melhor” “. Não me importo. É sem escolha. É grande demais para um sujeito normal, para mim, é a viagem mais sublime que jamais fiz na vida. Viagem sem grandes bagagens, que a gente aprende mais do que ensina. Ver voisas, ouvir, tocar, não desligar de outra pessoa, rir sem para e ver no espelho esse sorriso. Ver um pouco de mim no Gabriel e antever o que pode ser seu futuro sem ficar ansioso.
De pai ansioso sobrou um pouco, claro. De tudo resta um pouco, como diria o poeta. Mas nunca estive tão em paz com minha ansiedade como estou nesses últimos três meses. Já comemorei outros três meses para outros fatos da minha vida, mas nunca entendi tão bem a dimensão do que são 90 dias. Passa rápido quando a gente se diverte. Tudo mudou sim. Que bom!
p.s.: acho que o olhar continua da mesma cumplicidade …
